segunda-feira, 4 de maio de 2009

Rinocerontes em extinção

Napa deveria ser um rinoceronte feliz. Já estava em sua fase de maturidade e era respeitado por todos os animais da sua região, principalmente pelos outros rinocerontes. Napa havia conquistado uma vasta extensão territorial com a sua força e capacidade de luta. Desde a sua juventude nunca perdera a batalha para nenhum outro da sua espécie. Os poucos predadores que , desavisadamente tiveram a ousadia de atacá-lo, tiveram finais trágicos. Afinal, além de ser forte, Napa sempre criava novas formas de lutar o que surpreendia os seus adversários, com sua audição e seu olfato apurados identificava de longe qualquer ameaça.

Mas, apesar de ter comida de sobra, todas as fêmeas que desejasse e um território confortável , Napa começou a se tornar um rinoceronte triste. Ele matutava o dia todo : “aumentar a minha dominação não é difícil , basta empurrar outros rinocerontes para mais longe….tomar posse dos seus pastos e assumir as suas fêmeas….” , mas não era isso que ele queria. Napa olhava as estepes repletas de animais e, dentre eles, admirava secretamente o leopardo : “Ah se eu pudesse ser como o leopardo, um bicho bonito, de pele sedosa, que se alimenta de carnes nobres….e não essa coisa esdrúxula, de casca grossa que só come capim….”. E pensando dessa forma um dia ele resolveu : “se eu consigo ser o melhor entre os rinocerontes, imagine se a isto eu acrescentar as qualidades do leopardo….vou fazer benchmarking”.

Napa começou a estudar os leopardos e todas as suas características. Eles eram rápidos, se movimentavam de maneira extremamente silenciosa, enxergavam muito bem, davam botes certeiros, matavam rapidamente as suas presas com dentes e garras longos e afiados e nadavam muito bem. Napa concluiu que se ele , assim como os leopardos, também era um excelente nadador, também poderia adquirir as outras qualidades. Ele seria igual ao leopardo e seria admirado por toda a floresta.

Sua primeira decisão foi a de começar a comer carne. Não seria difícil, era só uma mudança de hábito alimentar. Nunca mais comeria grama, nem mel. Naquela manhã, quando várias manadas estavam bebendo e pastando em torno do lago, Napa disparou em direção a um grupo de zebras. Ninguém entendeu quando ele abalroou um delas que caiu morta imediatamente. Ele sofreu bastante para conseguir arrancar alguns pedaços, e mais ainda para engoli-los, o sabor era horroroso. Mas não desistiu….No dia seguinte quando começou a dar os primeiros passos todos os animais fugiram rapidamente. Napa passou fome naquele dia, mas não cedeu à tentação de comer capim.

No dia que se seguiu também passou fome, quando os outros animais corriam e se separavam ele perdia a noção de direção, afinal, ele enxergava muito mal. “Estes chifres estão atrapalhando a minha visão….o leopardo não tem chifres, por isso enxerga bem.”. Napa arrancou os chifres, mas a sua visão não melhorou. Não só passou fome mais um dia como as fêmeas começaram a se afastar dele achando que ele tinha enlouquecido. Além disso, outros rinocerontes começaram a vir observá-lo, no começo à distância, depois se aproximando e comendo o seu capim, Napa nem deu atenção para eles : “…são animais do passado….o rinoceronte do futuro é um animal carnívoro como o leopardo….”.

Depois de uma semana sem comer, Napa já começava dar sinal de fraqueza. Mas ele insistia na busca da sua meta. Começou a dormir de dia e tentar caçar à noite, como os leopardos. Foi pior, se enxergava mal no claro, no escuro deu trombadas em árvores e pedras. Amanheceu todo machucado. Nessa manhã tomou a decisão definitiva : “ vou passar fome mais alguns dias, esse excesso de peso que não permite que eu seja como o leopardo…”

Mais três dias se passaram e a fraqueza aumentava, ele ainda tentou caçar, mas estava cada vez mais lento. Precisava comer, mas só admitia comer carne. Para isso precisava de mais agilidade. Resolveu tirar a carapaça que o envolvia : “isso vai me dar a leveza dos leopardos, sem esse peso terei velocidade e passos silenciosos”. Mas não foi o que aconteceu. Quando surgiu no campo os animais olharam a imagem decadente de Napa e tiveram pena. Um rinoceronte sem couro, cambaleante e sem direção. Tentou correr mas não teve tempo. Um leopardo vendo Napa totalmente desarmado atacou-o cravando os dentes no seu pescoço desprotegido.

Muitas empresas têm agido como Napa. Estão bem situadas em seus mercados, têm o respeito das outras empresas e impõe medo a seus concorrentes sabendo lutar bem e usando adequadamente as suas forças e competências. Têm canais de distribuição fortes e bem estabelecidos, seus clientes estão satisfeitos e são fiéis. Mas essa empresas não estão satisfeitas em ser o que são. Elas querem ser o que é bonito , o que aparece na mídia empresarial, o que está na moda. Seus dirigentes esquecem do fato que são os resultados que realmente importam porque querem ser capa de revista.

Aí começam a querer ser o que não são. Qualquer semelhança com os leopardos serve como desculpa para quererem ser iguais a eles, mesmo sabendo que para isso terão de abandonar as suas características. Abandonam o seu canal de distribuição que levou décadas para se consolidar . Dispensam funcionários competentes e conhecedores do negócio. Abandonam as suas fontes de receita tradicionais. Abandonam os seus clientes.

Nesse momento os concorrentes começam a encontrar o espaço livre para atacar o seu mercado. No início de forma tímida e, à medida que encontram espaço, de forma voraz. As receitas vão caindo, as despesas sobem rapidamente (é caro ser um leopardo) e o lucro certo se transforma em grande prejuízo. Quando pensam em voltar atrás não é mais possível. Os dentes do leopardo já estão no seu pescoço.

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