domingo, 26 de julho de 2009

A barriga no balcão virtual


...todo artista tem de ir aonde o povo está...(Milton Nascimento)

Eu sou do tempo em que o professor de marketing na faculdade, depois de recitar o Kotler de cabo a rabo, dizia para gente que toda aquela teoria era muito boa mas, se não encostássemos a barriga no balcão, nunca conseguiríamos entender a respeito do que o guru dos marketeiros estava falando. Pior, nos tornaríamos apenas um bando de burocratas redigindo briefings imaginários para falar com um mercado que não existia.

Como eu sempre fui um bom aluno, segui as recomendações do professor. Toda vez que preciso entender melhor um produto ou mercado vou atrás de uma experiência pessoal com eles.

Já me fiz de vendedor de loja, de operador de central de atendimento, de auxiliar de vendedor de empresas que trabalham no business-to-business. Literalmente encostei a barriga no balcão, o que não é muito difícil pois, no meu caso, a barriga é grande.

Dentro do possível experimentei todos os produtos que eu, de uma maneira ou de outra, era responsável por vender. Quando isso não era possível (não era meu perfil comprar suprimentos odontológicos, nem nunca tive pendor para usar alguns produtos femininos) fui atrás de pessoas que fossem consumidores para entender melhor a relação deles com a marca.

Lojas continuam existindo. Vendedores continuam visitando clientes. As centrais de atendimento são obrigatórias. Só que agora temos mais um grande balcão que é o mundo virtual e não é possível que pessoas que se dizem profissionais da web 2.0 não façam a menor idéia do que estão falando, porque não são frequentadores desse mundo.

Mas essa é a realidade.

Ouço gente dizendo que não vai para o Orkut porque é brega (já ouvi as mesmas alegações sobre o You Tube, sobre os fotoblogs, sobre o MSN...), que o Twitter é coisa de nerd, que o Facebook é coisa de mauricinhos e patricinhas. Gente que não lê blogs alegando que não tem credibilidade (como se a mídia oficial fosse um padrão de imparcialidade e credibilidade) ou que não tem tempo (como se as pessoas que estão lá tivessem um dia com mais horas), que não participam de grupos e fórums de discussão porque tem gente muito estúpida em todos eles (claro, quem chama os outros de estúpidos são sempre sujeitos geniais).

Claro que existem modas virtuais que chegam e se vão rapidamente, como foi o caso do Second Life, quase destruído por aqueles que não faziam a menor idéia do que se tratava e tentaram transformá-lo numa cópia fiel da First Life. Não perceberam que as pessoas que criavam seu avatares queriam tudo, menos a vida real.

Justamente por não entenderem os milhões de pessoas que estão nos sites de relacionamento, nos grupos, nos blogs é que os marketeiros de escrivaninha continuam cometendo absurdos como pedir orçamento de um full banner em 4x4 cores (sim, eu já li isso e não era brincadeira de quem pediu). Continuam achando que mundo digital é fazer e-mail marketing, não perceberam que os consumidores mais jovens não usam mais e-mail. Continuam acreditando que número de page views é a única métrica da Internet (afinal, é tão fácil de entender quanto os relatórios de audiência do Ibope ou os números do IVC).

São marketeiros que acreditam que a vida digital é apenas uma tendência que vai se concretizar (ou não, a esperança de muitos) num futuro remoto quando eles já estiverem aposentados. Adoram assistir palestras futuristas, desde que não precisem participar dessas "mudernidades".

Enquanto isso, quem vai para o balcão da lojinha e entende o funcionamento das ferramentas e o comportamento dos consumidores que as utilizam começa a faturar.

Usando uma metáfora bem analógica, para que esses meus leitores me entendam, o trator da história já está passando sobre as suas cabeças. E ele não vai dar marcha-ré para salvar a sua cabeça.

E não vai dar nem para largar a carreira de marketeiro e ir fazer artesanato. Quem faz artesanato hoje já está vendendo também pela rede.

Esse artigo foi publicado originalmente no Coxa Creme

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Em busca do cliente perdido

De uns tempos para cá alguns teóricos e práticos do marketing direto têm insinuado que, talvez, essa não seja a melhor ferramenta para a captação de novos clientes. Alegam que o custo por atingimento unitário geralmente é alto, que a eficiência de resposta não é a mesma do passado o que pode, segundo eles, inviabilizar o custo por venda.

Em alguns momentos, eu temo concordar com eles. Pelo menos da forma como muitas ações de captação de novos clientes é feita. O descuido na seleção do público alvo, a comoditização das ofertas e a quase universal escolha de mídias digitais fazem dessas ações totalmente inóquas, quando não irritantes para os consumidores.

Como tudo em marketing direto, o primeiro problema é o da seleção de público. Muita gente ainda faz segmentação baseada nos conceitos sócio-demográficos da propaganda dos anos 70 (do século passado…). Todos dias ouvimos algum marketeiro definir seus prospects como homens (ou mulheres, nunca ambos), de 25 a 45 anos (desconhecem qualquer referência do envelhecimento da população que consome), da classe A gargalhada (que representa menos de 1% da população) dos Jardins, Moema e Itaim (Bibi é claro, nenhum deles sequer sabe da existência do Itaim Paulista).

Raros são os que olham para dentro de casa e entendem qual é o seu perfil de público, para buscar prospects que se asemelhem a esses. Raríssimos os que entendem o comportamento dos consumidores dos seus produtos e se escandalizariam se descobrissem que eles não formam uma massa homogênea.

Vamos supor que a escolha de público tenha sido correta e que esses aspectos foram levados em consideração e olhemos para a construção da oferta. Aliás, nem sei se deveria chamar de construção uma vez que, geralmente, são usadas só ofertas disponíveis em qualquer prateleira dos hipermercados do marketing. Limitam-se a descontos apresentados de forma direta ou indireta (o velho pague 3 leve 4), condições de pagamento nada diferentes do que se encontra em botequim de esquina ou brindes que já foram exaustivamente utilizados. Ou vai me dizer que nunca recebeu uma oferta imperdível para ganhar o passaporte de uma parque de diversões?

Por fim, a questão da mídia. Hoje 11 em cada 10 anunciantes declara que vai investir (sic) em mídias digitais. Até aí não haveria o menor problema, se houvesse realmente um planejamento de presença digital. O que acontece não é bem isso, apenas uma cultura de comunicação focada em custos que leva as empresas a se utilizarem de mídias baratas, mesmo que não dêem nenhum resultado, afinal o que importa é se manter dentro do budget, não gerar negócios. O sonho dourado é ser bem sucedido fazendo marketing viral, como se isso não custasse nada.

Público genérico, ofertas insossas e mídias aleatórias realmente só corroboram a tese de que é impossível captar clientes nesse modelo.

Agora, se o objetivo é captar clientes com qualidade (gente que gere rentabilidade e permaneça como cliente), o marketing direto bem feito ainda vai ser o melhor caminho. Ele é que oferece a oportunidade de falar com as pessoas certas, usando ofertas relevantes e através de mídias que sejam significativas para o cliente.

Agora, se pretende continuar fazendo mal feito, não tenha grandes esperanças.

Publicado originalmente no PaP-o-a-Três

domingo, 12 de julho de 2009

As moscas estão ganhando

Numa de suas antigas canções o sempre moderno e revolucionário Tom Zé falava de "tiros de canhão em bolhas de sabão", se referindo à inutilidade de um esforço imenso direcionado para o nada.

Me lembrou que, durante muito tempo, os profissionais de marketing direto se referiam ao marketing de massa como tiros de canhão para matar moscas, uma crítica à dispersão natural existente em toda comunicação de massa.

Não é possível negar que essa dispersão fosse real. Ainda mais considerando que os tiros da mídia de massa eram muito maiores (alguns programas de TV chegavam a ter mais de 80% de audiência) e o público alvo muito menor pois ainda nem tínhamos chegado à emergência consumidora da classe C.

Mas também temos de admitir que essas balas de canhão matavam todas as moscas que passassem na sua frente.

Por outro lado, nem sempre os tiros de espingarda do marketing direto conseguiam atingir seus alvos. Não por defeito das armas, nem por habilidade dos alvos de se esquivarem, mas porque os atiradores seguiam a mesma lógica do tiro de canhão, disparavam a esmo.

E ainda se gabavam disso. Contavam de boca cheia que tinham resultados fabulosos de 10% de retorno (ou seja, de casa 100 impactos tinham desperdiçado 90).

Os tempos mudaram. O calibre das armas de mídia de massa diminuíram muito, mesmo que ainda sejam armas pesadas. Por outro lado, o marketing direto descobriu ferramentas poderosas para atingir mais gente com custos muito mais baixos. Entrou na era da metralhadora automática.

O que não significa que houve uma melhora de eficiência. Muito pelo contrário, hoje alguns marketeiros diretos arrotam sucessos de 1 ou 2% de retorno (ou seja, agora perdem 98 em cada 100).

Contas feitas, o retorno sobre o investimento dessas ações aumentou, mas não por mérito dos atiradores, apenas porque as balas ficaram muito mais baratas.

E as moscas se proliferaram. Claro, com uma chance de sobrevivência de 90% já podiam se multiplicar às pencas, com 98% ninguém as segura.

Se não voltarmos rapidamente para o stand de tiro e não treinarmos exaustivamente segmentação, modelos estatísticos, análise de resposta e outras miras mais sofisticadas, daqui a pouco nem as moscas vamos acertar.

Vão sobrar só as bolhas de sabão.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

United Breaks Guitars

Essa história eu peguei de um dos bons pensadores-práticos do novo marketing, a quem sigo no Twitter. Seu nome é David Meerman Scott e um de seus livros que ajuda a entendermos as mudanças que vem acontecendo em nossa praia é The New Rules of Marketing and PR (As novas regras do marketing e das RPs).

Ele nos conta em seu blog, que a banda Sons of Maxwell ao viajarem pela United Airlines, tiveram uma de suas guitarras danificadas pelo pessoal que (teoricamente) deveria cuidar da bagagem.

Após toda a maratona de papelório e telemarketing, e passados nove meses sem solução, resolveram então criar essa música e colocar o clip no Youtube. O prejuízo direto da banda foi de 3.500 dolares. E o da companhia aérea, será de quanto?

Quando da postagem aqui, a contagem era de meio milhão de acessos em três dias, e crescendo.

domingo, 5 de julho de 2009

A Cultura postergada

A Livraria Cultura é o sonho de muitos paulistanos e, de uns tempos para cá, também de brasileiros de outras cidades por onde ela se espalhou. Sempre foi um espaço onde se encontrava de tudo que não existia em outros lugares.

No começo eram só livros. Depois ela avançou no terreno da música e dos filmes. Chegou a ter a melhor loja de clássicos e de jazz que eu já conheci (não, não é mais, nem de um nem de outro).

O grande mérito da Cultura, e que ela mantém até hoje, é que, tirando as pequenas livrarias onde os próprios donos atendem, ela é a única onde os vendedores sabem o que estão vendendo. São pessoas que gostam de ler, de ouvir e ver. E conseguem identificar o que você precisa pela mais remotas referências que você possa ter.

Nas demais redes isso não acontece. Aliás, os vendedores não sabem nem da existência de muitos autores, cantores ou cineastas. E nem estou falando de algum autor obscuro do Tabastistão Oriental, mas já vi atendente fazer cara de ué quando mencionei nomes "desconhecidos" como Bioy Casares, Leonard Cohen ou Carlos Saura.

Na Cultura não. Além de conhecerem os seres mais esdrúxulos e ainda conseguem te sugerir coisas que você nem sabia que existiam. Foi lá que fui apresentado a Carlos Kleiber e David Berlinski.

Até um programa de relacionamento eles tem. Fraco, mas tem. Oferecem um modelo básico de cash back. Sempre achei incompreensível como é que eles, sabendo exatamente o que eu compro, continuam me mandando newsletters que são iguais à de toda a torcida do Corinthians. São tão inúteis que há tempos já as mandei para o meu filtro de anti-spam.

Mas os tempos mudaram. Surgiram as moderníssimas teorias de gestão de estoque. Todas muito boas para a administração financeira da livraria e péssimas para os clientes, pois não se encontra mais nada do que se precisa.

Você procura um coisa e é informado que podem trazer da loja X em 24 horas, tenta achar outra e eles garantem que entregam em 7 dias. Complica um pouco mais e eles informam que podem importar em 4 semanas.

Mas... afinal de contas, é uma loja ou um centro de encomendas ?

Eu sou um consumidor de muitos produtos pela Internet (inclusive livros, CD´s e DVD´s) mas quando vou à uma loja minha expectativa é a de sair de lá com o produto debaixo do braço para consumo imediato. Se quisesse esperar ficava em casa.

E não são só eles. Os concorrentes fazem o mesmo, tem os mesmos defeitos e poucas das qualidades da Cultura.

Infelizmente para a livraria, a Amazon entrega os mesmos produtos em prazos muito parecidos e ainda tem um computador que faz indicações de cross-sell tão bem quanto os vendedores da Cultura.

Aos poucos a Livraria Cultura está perdendo um cliente de mais de 30 anos. Certamente não devo ser só eu. Depois vão dizer que é culpa da crise.