terça-feira, 27 de maio de 2008

Don Juan de Marketing


Todo mundo sabe quem foi Don Juan. Ou não ? A figura mítica do conquistador espanhol tem uma origem indefinida nas lendas espanholas e foi oficialmente publicada pela primeira vez em 1630 por Tirso de Molina sob o nome de “O sedutor de Sevilha”. Depois disso foi o tema de uma ópera de Mozart – Don Giovanni – de 1787, tema de peças de Moliére e de George Bernard Shaw e do poema satírico de Lord Byron. Além é claro de dezenas de versões cinematográficas, sendo a mais recente o “Don Juan de Marco” com Johnny Depp e Marlon Brando.

O resumo da história é simples. Don Juan era um notável sedutor, um romântico conquistador de mulheres que as abandonava logo após seduzi-las. Alguns contadores dessa história falam em centenas, outros em milhares de mulheres que caíram na sua lábia e na sua cama. Um dia seduz uma jovem de uma família nobre e mata o seu pai que duelava por sua honra. Algum tempo depois, ao passar em frente ao cemitério encontra com a estátua (fantasma) do pai que o convida para um jantar durante o qual Don Juan acaba sendo morto e arrastado para inferno (aliás a cena final do filme “Don Giovanni” de Joseph Losey é uma das mais impressionantes do cinema).

Muitas vezes eu tenho a impressão que no mundo de negócios e do marketing todos querem ser Don Juan. O objetivo de cada empresa é sempre conquistar novos clientes, usando as estratégias mais sedutoras e românticas e, assim que conseguem atingir esse objetivo passam a desprezá-lo e partir em busca de novas conquistas, mesmo que isso contrarie todas as teorias do marketing. Os profissionais mais valorizados são aqueles que tem a capacidade de conquistar novos mercados ou de seduzir os clientes de outras empresas para si ( aí a metáfora melhor seria com o Conde de Valmont de Laclos, mas essa é outra história). Perder tempo mantendo e tratando bem os clientes acaba sendo uma atividade semelhante a um casamento mau resolvido que já caiu na rotina e perdeu toda capacidade de realizar jogos de sedução.

Se não é assim, porque tantas empresas oferecerem condições comerciais melhores aos seus prospects do que aos seus clientes ? Há não muito tempo, uma escola de inglês de São Paulo espalhou outdoors pela cidade com a seguinte frase : “Aluno novo paga meia” . E os alunos antigos, aqueles que são clientes fiéis há muitos anos, pagam inteira ? Uma amiga relatou no ano passado o caso de um cartão de crédito que estava oferecendo anuidades grátis, como ela já era portadora do cartão solicitou seu direito à promoção e obteve a seguinte resposta : “para ter direito à anuidade grátis a senhora precisa cancelar seu cartão e solicitar um novo...” Algumas empresas de cartão de crédito já identificaram um perfil de comportamento de clientes que se tornaram os caça-gratuidade, ou seja, toda vez que vão ter de pagar a primeira anuidade, cancelam o seu cartão e pedem um novo de alguém que esteja sendo distribuído gratuitamente. Não é de surpreender que também são esse os clientes que dão menos lucro ( quando dão), estão entre os mau pagadores e, geralmente, entre os que mais reclamam.

Algumas empresas começaram a perceber que esse tipo de atitude era anti-produtiva e começaram a garantir aos seus clientes atuais , pelo menos, as mesmas vantagens oferecidas aos novos clientes. Mas será que isso é o que um cliente fiel espera do seu fornecedor, que seja tratado da mesma forma que todo o resto do mundo o é ? Ainda são raros os casos em que os clientes são realmente tratados de uma forma melhor que os prospects. No fundo é uma maldição criada pela idéia de “market share” que faz com que muitos profissionais de marketing passem a vida atrás de um 1 ponto percentual do relatório Nielsen, mesmo que isso signifique perda de margens e prejuízos espantosos no balanço de sua empresa quando poderiam estar gastando menos dinheiro e gerando lucros.

Mas, é claro, dá muito mais status ser um Don Juan do que um Papai Sabe Tudo (lembram dele ?), ainda que, mais hora menos hora, algum fantasma resolva convidá-lo para um jantar e conduzi-lo pela mão até a porta do inferno.

Um comentário:

Volney Faustini disse...

Um texto muito bom e bem esclarecedor, Fábio.

Realmente há diferença entre uma conquista casual daquela com bons e dignos propósitos - aliás, as empresas estão cheias de tabuletas de Missão e Visão apregoando isso, só que na prática dão uma de conquistador barato.

É realmente esquisito fazer a conquista pela conquista - para em seguida fazer uma marquinha na cama: IIII e a cada 5 riscar por cima (como contagem de bilhar)?

O esforço da fidelidade deve ser conseqüência e não efeito.